quarta-feira, 21 de junho de 2017

LIVRO MÍSTICA CIDADE DE DEUS – TOMO SEGUNDO MARIA NO MISTÉRIO DE CRISTO (NA VIDA OCULTA DE JESUS) CAPÍTULO 7 PAGINAS (29 A 33)

LIVRO MÍSTICA CIDADE DE DEUS – TOMO SEGUNDO
MARIA NO MISTÉRIO DE CRISTO (NA VIDA OCULTA DE JESUS)
CAPÍTULO 7 PAGINAS (29 A 33)

 
CELEBRA O ALTÍSSIMO NOVO DESPOSÓRIO COM A PRINCESA DO CÉU, A FIM DE PREPARÁ-LA PARA AS BODAS DA ENCARNAÇÃO.

A Encarnação, a maior de todas as obras divinas

70. Grandes são as obras do Altíssimo (S I 110 , 2), porque todas foram e são feitas com plenitude de ciência e bondade, justiça e medida (Sab 11 , 21). Nenhuma é incompleta, inútil, defeituosa, supérflua e vã: todas são primorosas e magníficas como o Senhor que, segundo a medida de sua vontade, as quis fazer e conservar do modo mais conveniente, para nelas ser conhecido e glorificado. Fora do mistério da Encarnação, porém, todas as obras de Deus ad extra, ainda que sejam grandes, estupendas e mais admiráveis que compreensíveis, não passam de pequenina centelha (Ecli 42,23) projetada do imenso abismo da divindade.
Somente o inefável sacramento de Deus fazer-se homem passível e mortal, pode ser chamado obra-prima do infinito poder e sabedoria, aquela que excede, sem comparação, às suas demais obras e maravilhas. Neste mistério, não foi comunicada aos homens apenas uma faísca da divindade, mas todo aquele vulcão de imenso incêndio, que se uniu com indissolúvel e eterna aliança, à nossa natureza humana e terrena.

A grandeza de Maria foi proporcionada à dignidade de Mãe de Deus

71. Se esta sagrada maravilha do Rei deve ser medida por sua mesma grandeza, era consequente que a mulher, em cujo seio tomaria forma de homem, fosse perfeita e adornada de todas suas riquezas. Deveria ter todos os dons e graças possíveis, com tal plenitude, que nenhum lhe fosse incompleto ou defeituoso.
Sendo isto racional e conveniente à grandeza do Onipotente, assim Ele o realizou com Maria Santíssima, melhor do que Assuero com a graciosa Ester (Est 2, 9), quando quis elevá-la ao trono de sua grandeza.
Preparou o Altíssimo nossa Rainha Maria com favores, privilégios e dons jamais imaginados pelas criaturas. Quando Ela surgiu à vista dos cortesãos deste grande Rei imortal dos séculos (Tim 1, 17), todos louvaram o poder divino que, ao escolher uma mulher para Mãe, pôde e soube torná-la digna de o receber por Filho.

Visão e graças do sétimo dia

72. Chegou o sétimo dia próximo a este mistério e, à mesma hora que nos anteriores, a Divina Senhora foi chamada e elevada espiritualmente, com certa diferença dos dias precedentes. Neste, foi levada corporalmente pelos santos anjos ao céu empíreo, ficando um deles em seu lugar, representando-a com corpo aparente. Chegada ao supremo céu, viu a divindade com visão abstrativa como nos outros dias, mas sempre com nova e mais intensa luz e mistérios mais profundos, que aquela Vontade sabe e pode esconder ou revelar.
Ouviu uma voz que saía do trono real dizendo: Vem, esposa e pomba escolhida, nossa graciosa e amada, que achaste graça a nossos olhos, eleita entre milhares, vem para novamente seres recebida por nossa única Esposa. Para isto, queremos te conferir o ornato e formosura dignos de nossos desejos.

Atitude e humildade da Virgem

73. A estas palavras, a humilíssima entre os humildes abateu-se e aniquilou-se na presença do Altíssimo, além de quanto possa compreender a humana capacidade. Toda entregue ao divino beneplácito, com aprazível retraimento, respondeu: Aqui está, Senhor, o pó e vil vermezinho, vossa pobre escrava, para que nela se cumpra vosso maior agrado. Servi-vos do humilde instrumento de vosso querer, governai-o com vossa destra.
Mandou o Altíssimo aos serafins, mais excelentes em dignidade e próximos ao trono, que assistissem aquela Mulher. Acompanhados por outros, colocaram-se em forma visível ao pé do trono onde se encontrava Maria Santíssima, mais inflamada no divino amor que todos eles.

Sentimentos dos Anjos

74. Era espetáculo de nova admiração e júbilo para todos os espíritos angélicos ver naquele lugar, jamais pisado por outros pés, um a humilde donzela, consagrada sua Rainha, mais próxima a Deus que todas as demais criaturas. Viam no céu, tão apreciada e considerada, aquela mulher (Prov. 31,10) que o mundo desprezava por desconhecê-la. Viam o penhor e princípio da elevação da natureza humana acima dos coros celestiais, e já estabelecida entre eles.
Oh! Que santa e doce inveja poderia causar esta peregrina maravilha aos antigos cortesãos da celeste Jerusalém! Que conceitos formariam para louvar seu Autor! Que afetos de humildade repetiriam, sujeitando seus elevados entendimentos à vontade e ordenação divina! Reconheceriam ser justo e santo que Ele elevasse os humildes e favorecesse a humana humildade, dando-lhe preferência à angélica.

Maria recebe a graça no mais alto grau

75. Estando os moradores do céu nesta digna admiração, a Santíssima Trindade (a nosso modo de entender) conferia consigo mesma quão agradável era a seus olhos a princesa Maria. Correspondera perfeita e inteiramente aos benefícios e dons que lhe foram confiados. Mediante eles havia conquistado a glória que adequadamente fazia reverter na do Senhor, e não tinha falta, defeito ou impedimento para receber a dignidade de Mãe do Verbo, para a qual fora destinada.
Determinaram as três divinas Pessoas acrescentar-lhe ainda o supremo grau de graça e amizade com Deus, grau que nenhuma outra criatura tivera nem teria jamais. Naquele momento conferiram-lhe mais graça do que possuíam todas as demais criaturas reunidas. Vendo realizada a suprema santidade, que para Maria ideara e concebera sua mente divina, grande foi por Ela seu agrado e complacência.

A manifestação visível da santidade de Maria

76. Correspondente a esta santidade, e em testemunho da benevolência com que o Senhor lhe comunicava novas influências de sua divina natureza, mandou que Maria fosse visivelmente ornada de veste e joias misteriosas, significando os dons interiores, graças e privilégios que lhe outorgava como Rainha e Esposa. Não obstante este ornato e desposório lhe terem sido concedidos outras vezes (1), como quando foi apresentada no templo, nesta ocasião foram acompanhados de novas excelências e admiração, porque constituíam a preparação próxima para o milagre da Encarnação.

A túnica, símbolo de sua pureza e graça

77. Por ordem divina, os serafins vestiram Maria santíssima com ampla túnica, símbolo de sua pureza e graça. Era de tão singular alvura e refulgente beleza, que se um só de seus raios luminosos brilhasse no mundo, daria maior claridade que todas as estrelas juntas, mesmo que estas fossem outros tantos sóis. Comparada com a sua, a luz que conhecemos pareceria obscuridade. Enquanto era assim vestida pelos serafins, recebeu do Altíssimo profunda inteligência que aquela graça lhe ocasionava a obrigação de corresponder a Deus com a fidelidade, o amor, e o excelente e o elevado modo de praticar tudo quanto compreendia.
Somente não lhe era revelada a intenção do Senhor tomar carne em seu seio virginal. Tudo o mais nossa grande Senhora compreendia e por tudo se humilhava com indizível prudência, pedindo o auxílio divino para corresponder a tais benefícios e favores.

O cinto, símbolo do temor de Deus

78. Colocaram-lhe os serafins sobre a veste um cinto, símbolo do santo temor que lhe era infundido. Riquíssimo, feito de pedras diversas, extremamente refulgentes, que muito o embelezavam. Ao mesmo tempo, foi a divina Princesa iluminada pela fonte de luz, em cuja presença se encontrava, para altamente entender as razões pelas quais Deus deve ser temido por toda criatura.
Com este dom do temor do Senhor, ficou convenientemente cingida e preparada, como era necessário a uma pura criatura, que tão familiarmente trataria e conversaria com o Criador, sendo verdadeira Mãe Sua.

Os cabelos, o diadema e as sandálias

79. Em seguida, conheceu que a ornavam com formosos e longos cabelos, mais brilhantes que o ouro refulgente, presos por rico diadema. Por este ornato, lhe era concedido que todos seus pensamentos, durante toda a vida, fossem elevados e divinos, inflamados em sublime caridade significada pelo ouro. Ao mesmo tempo, foram-lhe infundidos novos hábitos de sabedoria e ciência claríssima, para que estes cabelos ficassem graciosamente reunidos e presos por inexplicável participação na ciência e sabedoria do mesmo Deus.
Deram-lhe por sandálias a graça de que todos seus passos e movimentos fossem formosíssimos (Cant. 7), dirigidos sempre para os mais altos e santos fins da glória do Altíssimo. Prenderam-lhe este calçado, com especial graça de solicitude e diligência no agir para com Deus e com o próximo. Assim sucedeu quando, apressadamente (Lc 1,39), foi visitar Santa Isabel e São João. Deste modo, os passos desta filha do Príncipe (Cant. 7,1) tornaram-se formosíssimos.

Pulseiras, anéis e colar

80. Adornaram-na com pulseiras, infundindo-lhe nova magnanimidade para grandes obras, pela participação do atributo da magnificência. Assim, sempre aplicava suas mãos (Prov. 31,19) em coisas árduas. Embelezaram-lhe os dedos com anéis, novos dons do Espírito Santo, para que nas pequenas ações, em coisas de menor importância, agisse de modo superior, com intenções e circunstâncias que as tomavam todas admiráveis e grandiosas. Acrescentaram-lhe um colar de inestimáveis e brilhantes pedras preciosas. Dele pendia um conjunto de três pedras mais excelentes, as virtudes da fé, esperança e caridade, correspondentes às três divinas Pessoas. Por este ornato, renovaram-lhe os hábitos destas nobilíssimas virtudes, conforme deveria exercita-Ias nos mistérios da Encarnação e Redenção.

As arrecadas

81. Colocaram-lhe nas orelhas arrecadas de ouro (Cant. 1, 10), salpicadas de prata, preparando seus ouvidos para a embaixada que em breve receberia do Santo Arcanjo Gabriel. Foi-lhe dada especial ciência, para ouvir com atenção e responder discretamente com argumentos prudentíssimos e agradáveis à divina vontade. Do metal sonoro e puro da prata de sua candura, ressoaria aos ouvidos do Senhor, e ficariam gravadas em seu peito divino, aquelas esperadas e santas palavras: "Fiat mihi secundum verbum tuum" (Lc 1,38).

O ornato de sua túnica

82. Semearam sua veste de cifras em relevo, semelhantes a bordados de finíssimos matizes e ouro. Algumas diziam: Maria, Mãe de Deus; outras: Maria, Virgem e Mãe. Por então, não lhe foram revelados estes misteriosos dísticos, mas somente aos Santos Anjos. Os matizes eram os excelentes hábitos de todas as iminentes virtudes e de seus atos correspondentes, ultrapassando tudo quanto têm praticado as criaturas inteligentes.
Para complemento de toda esta beleza deram-lhe, qual água perfumada para banhar o rosto, muitas iluminações e resplendores, que a proximidade e participação do infinito ser e perfeições de Deus refletiam nesta divina Senhora. Convinha que, para recebê-lo real e verdadeiramente em seu ventre virginal, o houvesse recebido por graça, no sumo grau possível a pura criatura.

Impossível explicar a santidade da Virgem

83. Com este adorno e beleza, ficou nossa princesa Maria tão encantadora e cativante que o supremo Rei pôde cobiçá-la (S I 44, 12). Pelo que em outros lugares tenho dito de suas virtudes (2) e pelo que será forçoso repetir nesta História, não me detenho mais em explicar este adorno, que foi superior pelas suas circunstâncias e efeitos mais divinos. Tudo cabe no poder infinito e no imenso campo da perfeição e santidade, onde sempre fica muito que acrescentar e entender. Aproximando-nos deste mar de Maria puríssima, ficamos sempre muito à margem de sua grandeza, e meu entendimento sempre permanece repleto de conceitos que não consigo traduzir.


DOUTRINA QUE ME DEU MARIA, A RAINHA SANTÍSSIMA

Deus deseja agraciar as almas

84. Minha filha, as ocultas oficinas e recamaras do Altíssimo são de Rei divino e Senhor onipotente. Sem medida e sem número são as ricas joias que nelas guarda, para compor o adorno de suas esposas escolhidas. Assim como enriqueceu minha alma, poderia fazer com outras inumeráveis, e sempre lhe sobraria infinitamente. Ainda que a nenhuma criatura dará tanto como a mim, não será por não poder ou não querer, mas sim porque nenhuma se disporá para a graça como Eu. Apesar disso, com muitas o Todo-Poderoso é liberalíssimo e as enriquece grandemente, por terem menos impedimento e mais disposição que outras.

Disposições para elevar-se na graça

85. Desejo, caríssima, que não oponhas obstáculos ao amor do Senhor por ti. Quero que te disponhas a receber os dons e joias com que te quer preparar e te fazer digna de seu tálamo de esposo. Saiba que todas as almas recebem dele este ornato de sua amizade e graça, mas cada qual no grau de que é capaz. Se desejas chegar aos mais elevados graus desta perfeição e ser digna da presença de teu Senhor e Esposo, procura crescer e ser forte no amor, que aumenta na medida da renúncia e mortificação. Esquece e deixa todas as coisas terrenas; extingue a inclinação por ti mesma e pelas coisas visíveis. Lava-te frequentemente no Sangue de Cristo, teu Redentor, renovando a amorosa dor da contrição de tuas culpas. Deste modo encontrarás graça a seus olhos, Ele cobiçará tua beleza (SI 44,12) e teu adorno será cheio de perfeição e pureza.

Gratidão e humildade

86. Como foste pelo Senhor tão distinguida nestes favores, é razão que sejas mais agradecida que muitas gerações, louvando-O e engrandecendo-O incessantemente pelo que contigo se dignou realizar. Se o vício da ingratidão é tão repreensível nas criaturas que devem menos e que, terrenas e grosseiras, desprezam e esquecem os benefícios do Senhor, maior será esta vilania em ti.
Não te enganes com pretexto de humildade, porque há muita diferença entre humildade agradecida e ingratidão erradamente humilhada. Deves lembrar que muitas vezes o Senhor fez grandes favores a indignos, para manifestar sua bondade e grandeza, e para que ninguém se exalte por causa deles. O conhecimento da própria indignidade serve de contrapeso e antídoto contra o veneno da presunção. Isto não deve impedir a gratidão e o reconhecimento que todo dom perfeito (Tgo 1,17) pertence e desce do Pai das luzes, e por si mesma a criatura nunca os pode merecer. Se tudo lhe é dado unicamente pela bondade divina, deve penetrar-se toda de gratidão.


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